É difícil encontrar alguém que nunca tenha usado ou ouvido ao menos uma variante da expressão “trabalhado feito um cavalo”, frase empregada geralmente para referir-se a um trabalho muito pesado, a uma jornada muito longa de trabalho ou a junção de tudo isso. Assim “trabalhar como um cavalo”, se traduz na prática de um afazer laboral em seu aspecto negativo, pesado, desgastante e contínuo, que se compara ao trabalho realizado por animais, como é o caso dos cavalos mais especificamente, cuja rudeza do dia-a-dia podia ser facilmente verificada pela maioria das pessoas num passado não muito distante.
Sem intenção de atribuir qualquer conotação pejorativa ao emprego do termo, tanto vários de nossos avós, nas “lidas” do seu cotidiano, muitas vezes dedicado a afazeres então baseados essencialmente no trabalho braçal, como a agricultura, a extração de madeira e a própria pecuária, “trabalhavam feito cavalos”; quanto ainda hoje, rotinas extremamente desgastantes, pela força empregada ou a própria quantidade de afazeres, que muitas vezes não se restringem à determinados períodos, apresentando-se como situações comuns e contínuas, mantém viva essa antiga expressão de comparação ao trabalho realizado por animais.
Enquanto alguns (cavalos) privilegiados eram bem tratados, bem cuidados e empregados em atividades leves ou esporádicas, como certos animais de montaria, outros, não tão sortudos, tinham a vida dedicada ao trabalho, um trabalho baseado na força, pois em épocas onde não haviam motores para movimentar grandes máquinas, engrenagens, mesmo veículos para o transporte de pessoas e cargas ou, mesmo em regiões onde essas tecnologias ainda não estavam disponíveis ou acessíveis (por distâncias ou custos), a tração animal era, a melhor alternativa, ou pelo menos a que estava “mais a mão”.
Das charretes para o transporte rápido, à carroças, veículos maiores e mais pesados, empregadas como táxis de outros tempos, os cavalos, na ausência de automóveis, foram amplamente usados no transporte de pessoas e, se puxar uma carroça de madeira, pesada, com gente em cima, suas bagagens, estar preso a ela por aparatos não muito confortáveis e, ainda levar umas chicotadas de vez em quando parece ruim, pode ter certeza, existiam coisas piores.
Quando nossas casas eram edificadas sobre fundações feitas com pedra, em blocos que, é claro, não tinham nada de pequenos ou leves, o transporte dessas pedras, entre a pedreira em que eram extraídas e o local onde seriam empregadas era todo realizado por carroças com tração à cavalo. Da mesma forma como, sem os tratores e os implementos agrícolas de hoje em dia, os arados que dia após dia, rasgavam o solo para o plantio da safra, eram puxados por cavalos (numa cena que mesmo atualmente ainda não está extinta).
Se caminhões de hoje em dia tem limite de carga, em peso e volume e seu desrespeito causa danos ao veículo e as estradas, além de representar uma série de outros riscos aos demais que transitam pelas rodovias, cavalos não vinham com essa especificação e, apesar de experiência e conhecimento serem determinantes para calcular o limite do esforço que os animais podiam ser submetidos, provavelmente, em alguns casos, o trabalho chegava a levar o animal à exaustão, mas, porém na maioria dos casos, respeitava-se um certo limite, um pouco subjetivo, um limite determinado pelo bom senso, afinal, como os caminhões de hoje, animais parados, seja por motivo de doença ou ferimentos, eram sinal de prejuízo.
Mas, nem por isso deixavam de fazer força, muita força, basta observar algumas fotografias antigas, com flagrantes do transporte de cargas, principalmente madeira, para ter uma ideia do que era exigido desses animais, ao que pode-se somar, estradas por diversas vezes em más condições, enlameadas, barrentas, passagem por áreas de banhados, subidas e descidas íngremes que tinham que ser transpostas e que tornavam as dificuldades de locomoção ainda maiores.
E, se a carga não fosse tão pesada assim, era possível que o volume transportado estivesse um pouco além das tábuas laterais da carroça ou então do toldo que cobria muitas delas, chegando às vezes, a tomar formas bem exageradas, exageradas ao ponto de fazer inveja a qualquer caminhão da atualidade, como a carroça de barris apresentada nesta página.
Assim, nada como analisar um cavalo de antigamente para se ter uma idéia do que hoje chamamos de “trabalhar feito um cavalo” e, se nós ganhamos em comodidade com as tecnologias que o passar dos anos nos proporciona, eles, os cavalos, também ganharam muito com isso.