Há alguns anos, umas poucas décadas atrás, a comemoração da Páscoa, como não podia deixar de ser, seguia a mesma (ou quase a mesma) ideia da festa que estamos nos aproximando.
Uma tradição religiosa repleta de ritos e costumes próprios, símbolos e figuras amplamente conhecidos e, um encanto todo especial sobre as crianças que aguardam ansiosas a manhã de domingo, características que unem passado e presente, mas que apesar de parecidos, podem ser também, certa forma, bem diferentes.
Uma Páscoa dos anos de 1950 ou 1960 aqui em nossas cidades, que era muito bem marcada pelo período de Quaresma que a antecedia, um tempo de salões de baile fechados, sem música, ou pelo menos sem música altas e, é claro, sem dança (que segundo a frase bem conhecida “dava rabo”), tudo, como sinal de respeito e preparação espiritual para a festa da ressurreição de Jesus Cristo.
Religiosidade que tinha (e que em alguns lugares ainda tem) uma boa pitada de superstições, afinal, quem nunca ouviu história de que nas Quaresma havia uma maior ocorrência da aparição de Assombrações, como se esse fosse um período propício para “fantasmas e lobisomens” (e outros seres do imaginário popular) darem o “ar da graça” e povoarem mentes e rodas de conversa.
E na noite de Sexta-Feira Santa, deixados os medos de lado, era hora de sorrateiramente, junto dos amigos, pendurar os “Judas” pelas casas e paióis da vizinhança, numa brincadeira bem humorada que rende risos até hoje.
Nas casas, cascas de ovos guardadas já há algumas semanas eram pintadas pelas famílias com cores variadas e, em uma situação posterior, mais reservada, longe das vistas dos filhos, a mãe recheava essas cascas com amendoins doces (bem comumente em outros casos, os ovos eram cozidos e tinham suas cascas tingidas).
Mesma família que também confeccionava suas cestas com caixas de papelão e papéis coloridos e ainda, faziam ninhos no feno (guardado para consumo dos animais no inverno) dos paióis, os quais eram identificados com os nomes de todos os familiares e, bem vigiados pelas crianças até o dia da Páscoa, sempre na expectativa de ver o “Coelho da Páscoa”.
Ânsiosidade que fazia o filhos pularem cedo das camas no domingo e, cada qual com a sua cestinha, correr para o paiol, para surpreenderem-se com aquilo que tanto aguardaram, o tão espero sinal da passagem do Coelho, os ovos pintados anteriormente, agora recheados e os doces deixados naqueles ninhos de feno (engenhosamente colocados pelos pais minutos antes).
Casquinhas com amendoins, ovos cozidos pintados e chocolates, numa quantia bem mais comedida que ao que estamos habituados hoje em dia, em formatos tradicionais de ovos e coelhos, deliciosas guloseimas, apreciadas em poucas ocasiões a cada ano.
Doces que não eram já consumidos como se poderia imaginar, mas serviam como brinquedo, devido aos seus formatos, por vários dias antes de serem saboreados pelas crianças.
Após colherem os doces nos paióis, a família seguia junta as atividades daquele dia. Com suas melhores roupas, eles saiam em direção à igreja, afinal a religião está a todo tempo presente, de braços dados, numa cena muito interessante, sem carroças para facilitar a viagem, a família caminhava quilômetros dos bairros até a igreja matriz para assistir a missa.
E na volta, todos juntos, sentavam-se à mesa preparada especialmente para aquela ocasião, toalha branca, comida posta à mesa, broas especiais, raiz forte, beterraba, churrasco e gasosa, alimentos que, numa época dita “mais difícil”, tinham data marcada para aparecerem na mesa da maioria das famílias, como na Páscoa, no Natal e no Ano Novo.
Assim a Páscoa é a mesma, as famílias, mesmo de gerações renovadas, também, mas a forma que as “coisas da Páscoa” aconteciam antigamente e acontecem hoje em dia, parecem mesmo diferentes, se nem tanto em conteúdo, pelo menos na forma e significado com que a Páscoa era celebrada.
Mudanças cujo sentido, positivo ou negativo dependem da visão daqueles que olham para o passado ou buscam fazer do presente algo melhor.
Feliz Páscoa!