Em tempos de Copa do Mundo no Brasil, quando praticamente respiramos o esporte mais popular do planeta, tamanha a ênfase dedicada pela mídia à competição da FIFA, quem algum dia, pelo menos por algum instante neste país, como nas palavras da música de Nando Reis e Samuel Rosa, “não sonhou em ser um jogador de futebol?”
E não apenas ser um jogador de futebol, mas também vestir a camisa de um grande clube brasileiro; jogar em grandes estádios; ser campeão e, campeão sobre o arquirrival ou então, após um emocionante gol no último minuto da partida; destacar-se individualmente; ganhar premiações; ser ídolo do seu time; ter o nome gritado pela torcida; e, é claro, a defender as cores da Seleção Brasileira.
Um sonho ou um objetivo que para ser atingido necessita de muita técnica, habilidade, persistência e, de porque “não”, sorte, exigências que fazem para muitos, o desejo de se tornar “jogador” algo extremamente difícil, uma coisa tão próxima do impossível quanto distante da própria realidade em que vivemos.
Difícil “sim”, como alcançar o pleno sucesso, unindo realização e reconhecimento em qualquer profissão, porém não tão distante da nossa realidade assim, principalmente para quem conhece a história de um menino, chamado “Tonico”, que cresceu jogando bola nos campinhos de Riomafra.
Florianopolitano, nascido em 1914, Antônio Motta Espezim, mais conhecido por “Tonico”, passou a morar em Mafra quando ainda era criança e aqui, o passar dos anos somado ao desenvolvimento das suas habilidades com a bola, fizeram com que o futebol deixasse de ser encarado por ele como um simples passatempo, uma diversão ou mesmo uma brincadeira, passando a ser tratado com profissionalismo. Foi em nossa cidade que Tonico iniciou sua carreira no esporte, jogando na posição de médio direito (equivalente ao atual lateral direito) no Pery Ferroviário, onde chamava a atenção por sua capacidade de congregar agilidade, preparo, marcação e disciplina. Diferencial que despertou a atenção do Coritiba Foot Ball Club, que em 1940 o levou para a capital paranaense para integrar o que viria a ser um dos mais vitoriosos elencos da sua história.
Em seu primeiro ano defendendo as cores do alviverde participou da partida de inauguração do estádio do Pacaembu (SP), disputada por Palestra Itália (hoje Palmeiras) e Coritiba e, ainda em 1940, ergueu pela primeira vez a taça de campeão paranaense, título conquistado sobre o sempre rival, Atlético.
Em 1942 foi bicampeão estadual, sendo convocado para a Seleção Brasileira que disputaria a 17ª edição do Campeonato Sul-Americano de Futebol (a Copa América), a mais importante competição internacional para o Brasil naquela época (lembrando que entre 1938 e 1950 não foram realizadas Copas do Mundo, pois vivíamos o contexto e consequências da 2ª Grande Guerra). Mas uma contusão sofrida durante os treinamentos em Minas Gerais, não permitiu que Tonico participasse do torneio ao lado de grandes nomes, como Zizinho e Domingos da Guia que, para tristeza da torcida canarinho, veriam o Uruguai sagrar-se vitorioso.
De volta ao Coritiba e após tornar-se mais uma vez bicampeão paranaense (1946 e 1947), tornou-se o primeiro jogador brasileiro a receber o prêmio “Belfort Duarte”, uma homenagem oferecida pelo Conselho Nacional de Desportos (órgão extinto em 1993) entre os anos de 1946 e 1981 (e recentemente reeditado pela Confederação Brasileira de Futebol – CBF), aos jogadores que completassem 10 anos, com no mínimo 200 partidas oficiais disputadas, sem sofrer qualquer expulsão de campo. Prêmio que faz Tonico figurar até hoje entre nomes consagrados como Didi, Tele Santana, Pepe, Félix, Evaristo de Macedo e Vavá.
Em 1951, após 12 anos jogando pelo Coritiba, deixou os gramados sendo campeão paranaense pela 5ª vez, agora sob a grande emoção de ver sua equipe marcaro gol decisivo no último minuto do jogo contra o Ferroviário (time que mais tarde seria um dos formadores do atual Paraná Cube). Fim de carreira como jogador, mas que não representou o afastamento do futebol ou do clube que tão bem representou, mas a passagem à função de preparação das categorias de base do Alto da Glória.
Falecido em 2010, aos 96 anos, esse mafrense de criação, que figura entre os ídolos da história Coxa-Branca (o que é facilmente verificado no site oficial do Coritiba), deixou não só seu exemplo de grande profissional, como principalmente a prova de que uma criança que “joga bola” em nossos campinhos pode “sim”, mais do que simplesmente sonhar em ser um jogador de futebol.