Estamos a menos de 20 dias da comemoração de mais um aniversário de Mafra, o 97º ano de criação do município cuja história, muito mais antiga, ultrapassa em longe a marca de um século, e por que não, dois séculos, já que muito antes da criação do município de Mafra, seu território já era cruzado por tropeiros e exploradores, em viagens realizadas principalmente entre o Rio Grande e São Paulo, como são os casos do sargento-mor Francisco de Souza Faria, responsável pela abertura de um caminho entre Laguna a Curitiba, que apontam a nossa região do São Lourenço como parte do itinerário de sua viagem em 1730; ou então, a passagem da tropa do Brigadeiro José Custódio de Sá e Faria quinze anos depois, em 1745.
Ao longo do tempo, por uma história que mistura-se tanto ao passado de Rio Negro como de boa parte de nossa região, vários são os fatos que poderiam ser apontadas como marcos do início dessa trajetória, entre eles, o chamado “Abarracamento do São Lourenço”.
Embora na década de 1820 já houvesse alguns moradores nesta área e, que assimportanto, o tal “Abarracamento” não fosse a primeira construção ou moradia a ser levantada em solo riomafrense, é praticamente inegável dizer que ele representa um dos símbolos materiais do surgimento de nossas cidades, do estabelecimento dos trabalhadores que abriram a Estrada da Mata, que propiciaram e participaram da fundação do nosso núcleo de povoamento.
Em 1826 com a aprovação da abertura da Estrada da Mata, João da Silva Machado, o futuro “Barão de Antonina”, então como sargento-mor, foi nomeado inspetor da obra, passando a conduzir pessoalmente os trabalhos, realizados nas terras que ele mesmo, anos antes, percorrera na condução de suas tropas de gado.
Foi aqui, em Mafra e Rio Negro, enfrentando o ambiente hostil daquele período, marcado pela falta de recursos em meio a uma constante sensação de insegurança, motivada pela presença de indígenas na região, que se levantou o “abarracamento do São Lourenço”, um conjunto de benfeitorias destinadas ao suporte, abrigamento e segurança dos trabalhadores empregados na obra de abertura da estrada. Instalações que também acolheram um pequeno grupamento militar, responsável por proteção contra o possível ataque de índios e manutenção da ordem entre os próprios trabalhadores.
Consta que o Abarracamento foi construído na localidade do São Lourenço, caminho e local de pouso de tropeiros, à margem do rio de mesmo nome, tendo como instalação principal uma casa coberta de telhas, com cerca de 28 metros de frente, a qual se ligava a um “complemento” de aproximadamente 4 metros de comprimento.
Próximo a casa, ergueu-se um paiol, feito de pau a pique e também coberto de telhas, que media algo entre 7m x 6m; um pouco mais distante ficavam dois monjolos, movidos com a água de um arroio, cobertos com estrutura de madeira e palha; e, completando o conjunto, havia uma pequena olaria e um forno de cozer telhas, que propiciou a cobertura do paiol e da casa principal, oferecendo um melhor acabamento e conforto aos trabalhadores que ali se abrigavam.
Utilizado por alguns anos, até a sede da construção da “Estrada da Mata” ser transferida para as proximidades do rio Negro, em sua margem esquerda (área onde acha-se hoje a praça Hercílio Luz), o Abarracamento do São Lourenço foi ocupado por uma tropa militar em 1835, logo depois da eclosão da Revolução Farroupilha, soldados que tinham a missão de guarnecer a estrada que conduzia à província rebelde e, também proteger o território da então Província de São Paulo de um possível avanço farroupilha.
Foi somente em 1845, quando do término da Guerra dos Farrapos, quando as tropas envolvidas no conflito retornaram aos seus locais de origem, que o Abarracamenco foi desocupado.
Sede da Estrada da Mata, de onde o Barão de Antonina dirigiu a construção dessa importante obra, no caminho das tropas que cruzavam a região, base de militares durante a Revolução Farroupilha, o “Abarracamento do São Lourenço” é não só parte integrante, como realmente envolvida em importantes episódios da nossa história, de uma história que vai além das datas de emancipação ou criação e que é compartilhada por mafrenses e rionegrenses.