Uma das coisas interessantes em história é a possibilidade de estudá-la de diversas formas, algumas delas bem rígidas e outras de maneira mais descontraída, que não por isso deixam de lado o seu caráter científico, que é o que lhe confere credibilidade. Uma dessas formas, que confere à história uma imagem mais atraente, permite usar coisas comuns do nosso cotidiano, informações de amplo conhecimento, pontos curiosos não tão conhecidos que, com a junção das diferentes peças (fatos), permitem a leitura histórica, semelhante a montar um quebra-cabeça.
Pense comigo, geralmente quando um local público é nomeado, imagina-se que ali há algo que faça referência a essa denominação, escolas tem letreiros em suas fachadas, ruas tem placas, municípios tem portais, praças tem bustos e assim por diante.
Aqui em RioMafra a gente vê isso acontecer, basta andar por nossas cidades para ver os portais com o nome das cidades, placas de rua Felipe Schmidt, avenida Vicente Machado, letreiros de Colégio Barão de Antonina e Colégio Caetano Munhoz da Rocha. Da mesma forma, vê-se o busto do “Sargento Max Wolff Filho” na praça “Sargento Max Wolff Filho”, o busto de “Lauro Müller” na praça “Lauro Müller”. Diante desses exemplos, fica fácil responder a seguinte pergunta: De quem é o busto que fica no centro da praça “João Pessoa”, no centro de Rio Negro, junto ao calçadão, local que reúne centenas de pessoas todas as quartas-feiras à noite na feira da lua? Se você imaginou o óbvio, “João Pessoa”, você está totalmente errado, o busto é de “Manoel Ribas”, o que faz do caso uma exceção à regra que tentou-se expor.
Diante disso, vamos achar juntos a explicação para o caso:
Primeiro lembremos quem foram esses dois vultos que dão nome à praça e ao busto: João Pessoa foi governador da Paraíba, candidato à Vice-Presidente de Getúlio Vargas nas eleições de 1929 (em que foram derrotados pelo paulista Júlio Prestes), sendo assassinado na capital daquele estado em julho de 1930. Manoel Ribas foi “Interventor”, nomeado pelo então Presidente da República, para o governo do Estado do Paraná em 1932, cargo no qual permaneceu até 1945.
Agora, com relação à algumas datas, temos que a praça foi denominada “João Pessoa” em outubro de 1930 e o busto de “Manoel Ribas” inaugurado em 1943.
Como peça final, recordemos ainda como estava constituído o executivo rionegrense nessa época: Joaquim Ferreira do Amaral e Silva Assumiu a prefeitura em 06/10/1930, em substituição a Nivaldo de Almeida, tudo como conseqüência da Revolução de 1930. Em 1935 Raul de Almeida substituiu Joaquim, este permanecendo como prefeito até 1944.
Assim, qual é o elo que une todas essas peças (informações)? Primeiramente a contemporaneidade dos fatos, do princípio da década de 1930 até o início dos anos 40; em segundo lugar, o contexto histórico-político da época: Foi em 1930 que a hegemonia paulista no comando da política nacional foi quebrada por um golpe de estado, conhecido como Revolução de 1930, que empossou o gaúcho Getúlio Vargas como Presidente da República e que, dentre muitas outras coisas, levou a intervenção federal nos estados com a nomeação de novos governadores (Interventores). Lembrando que Getúlio perpetuou-se no cargo até 1945, a custa de jogadas políticas, golpes de marketing, muito populismo e uma boa pitada de autoritarismo ditatorial.
Disso tudo, temos o seguinte cenário, uma Revolução que levou Getúlio à Presidência e alterou a ordem política de então, implicando na aplicação de medidas autoritárias, como o afastamento de políticos de seus cargos, no caso específico, tanto o governador paranaense quanto o prefeito rionegrense e, a nomeação de Manoel Ribas e Joaquim Ferreira do Amaral e Silva, respectivamente.
Assim, temos que todos estavam sob os reflexos da revolução e do governo Vargas e, sabendo que homenagear alguém publicamente é forma tanto de afirmar a importância e a legalidade de algo (a revolução e a autoridade dos novos governantes, por exemplo), quanto também mostrar seu apoio aos superiores (o município em relação ao Estado e o País), a praça recebeu o nome do candidato à vice-presidente da chapa de Getúlio (eleições de 1929), cujo assassinato foi usado como estopim para a revolução, ou seja, um símbolo daquele momento histórico e, o busto foi erguido em homenagem ao Interventor do governo do Paraná, que aliás, era governador quando a estátua foi inaugurada.
Assim montamos o quebra-cabeça da história e temos porque a praça de Rio Negro tem, curiosamente, um nome e o busto que diferem entre si, algo interessante que nem sempre é notado no corre-corre do nosso dia-a-dia.